ESTÚDIO 57
Uma caixa de madeira (misturadora de faixas), dois Gira Discos, uma embalagem plástica de medicamento de forma circular (o Micro), um emissor tsf e uma antena metálica eram as componentes suficientes e necessárias para o sucesso. Estávamos nos finais dos anos setenta do Século XX e o engenheiro de serviço era o Luís Paulo Rosa. Nós, os outros, seríamos os animadores radiofónicos e pau para toda a obra; desde montadores de equipamento, ouvintes, capta dores de audiência, etc etc.
Na altura a única Rádio (para além de nós, claro!) era uma Emissora existente além do Tejo, uma Rádio de Abrantes, ainda hoje reconhecida como pioneira nestas andanças das emissões piratas. Por cá eram as engenhocas do Luís Paulo que faziam sucesso. Acabado de fazer um Curso técnico para depois aplicar às televisões dos clientes da loja, o engenheiro de serviço aplicava os seus conhecimentos num empreendimento complexo e arriscado.
Lembro-me de uma conversa à “sucapa” em que o técnico nos convidava a fazer Rádio. Era ilegal e por isso implicava algumas precauções. O Fazé e eu achámos pouco provável tal ideia, mas fomos alinhando. O Fausto adoptou um nome fictício, uma espécie de pseudónimo artístico (de que já não me lembro) e eu, por razões de conveniência recebi o William Bolota, como cognome, reconhecido pela ingestão permanente de bolotas que a tia Matilde me mandava do Alentejo. O Toi tinha discos recentes e era um dos grandes entusiastas; também não me recordo do seu nome de marca, mas ainda me lembro da sua postura descontraída e divertida.
Tínhamos por volta dos 16/17 anos de idade e já sonhávamos com a fama e principalmente com o prazer de sermos ouvidos. Os objectivos eram ambiciosos (para a altura) e centravam-se numa cobertura mediática que não fosse além de Alhos Vedros. Penso que uma vez até fomos ouvidos na Baixa da Banheira (não tenho a certeza), o que teria deixado o técnico um pouco preocupado.
Certo dia o Luís Paulo, anunciou o terminus da sua experimentação: “já tenho o emissor pronto”. Entusiasmados iniciámos o plano de acção. Mas como? Onde? Nas semanas seguintes, no mais perfeito secretismo, andámos de local em local, à procura da melhor localização para os Estúdios. Desde a Sala de Estar do Luís Paulo até à Garagem do Fausto, passando pela Loja, todos os locais foram experimentados. Enquanto um montava a Antena, outro se preparava para entrar nas pistas com discos seleccionados a rigor. Outro de nós teria que vir à rua com um daqueles rádios de ouvir relatos para confirmar o alcance e a recepção do sinal.
O receio da Inspecção dos Serviços de comunicação, polícias do Hertz português, que andavam à “coca” era um facto incontornável e por isso era preciso ter cuidado. Todos os dias era preciso montar e desmontar o vasto equipamento. Para o Mestre não era difícil; o pior de tudo era se o pai Plácido descobrisse as suas actividades clandestinas. Por isso o local de emissão variava consoante o medo e a disponibilidade logística.
O sucesso foi confirmado quando o som de um dos nossos discos foi ouvido lá para a zona da Bela Rosa. Da Loja até à Bela Rosa era obra: era muita distância e isso podia implicar muitos ouvintes, provavelmente mais de cinco. Nesse momento tínhamos concretizado um sonho. O Hotel Califórnia e os álbuns mais recentes dos Génesis eram a nossa Play List mais adoptada, porque a discografia disponível era reduzida e dependente dos recursos de cada um.
Assim, teria nascido a mãe legitima da Rádio Opção, que foi um marco inquestionável na cultura e na intervenção cultural em Alhos Vedros, mais tarde associada à CACAV, que todos reconhecem como uma Associação de prestígio no Concelho da Moita até aos dias de hoje.
(continua)
Luís Mourinha
Uma caixa de madeira (misturadora de faixas), dois Gira Discos, uma embalagem plástica de medicamento de forma circular (o Micro), um emissor tsf e uma antena metálica eram as componentes suficientes e necessárias para o sucesso. Estávamos nos finais dos anos setenta do Século XX e o engenheiro de serviço era o Luís Paulo Rosa. Nós, os outros, seríamos os animadores radiofónicos e pau para toda a obra; desde montadores de equipamento, ouvintes, capta dores de audiência, etc etc.
Na altura a única Rádio (para além de nós, claro!) era uma Emissora existente além do Tejo, uma Rádio de Abrantes, ainda hoje reconhecida como pioneira nestas andanças das emissões piratas. Por cá eram as engenhocas do Luís Paulo que faziam sucesso. Acabado de fazer um Curso técnico para depois aplicar às televisões dos clientes da loja, o engenheiro de serviço aplicava os seus conhecimentos num empreendimento complexo e arriscado.
Lembro-me de uma conversa à “sucapa” em que o técnico nos convidava a fazer Rádio. Era ilegal e por isso implicava algumas precauções. O Fazé e eu achámos pouco provável tal ideia, mas fomos alinhando. O Fausto adoptou um nome fictício, uma espécie de pseudónimo artístico (de que já não me lembro) e eu, por razões de conveniência recebi o William Bolota, como cognome, reconhecido pela ingestão permanente de bolotas que a tia Matilde me mandava do Alentejo. O Toi tinha discos recentes e era um dos grandes entusiastas; também não me recordo do seu nome de marca, mas ainda me lembro da sua postura descontraída e divertida.
Tínhamos por volta dos 16/17 anos de idade e já sonhávamos com a fama e principalmente com o prazer de sermos ouvidos. Os objectivos eram ambiciosos (para a altura) e centravam-se numa cobertura mediática que não fosse além de Alhos Vedros. Penso que uma vez até fomos ouvidos na Baixa da Banheira (não tenho a certeza), o que teria deixado o técnico um pouco preocupado.
Certo dia o Luís Paulo, anunciou o terminus da sua experimentação: “já tenho o emissor pronto”. Entusiasmados iniciámos o plano de acção. Mas como? Onde? Nas semanas seguintes, no mais perfeito secretismo, andámos de local em local, à procura da melhor localização para os Estúdios. Desde a Sala de Estar do Luís Paulo até à Garagem do Fausto, passando pela Loja, todos os locais foram experimentados. Enquanto um montava a Antena, outro se preparava para entrar nas pistas com discos seleccionados a rigor. Outro de nós teria que vir à rua com um daqueles rádios de ouvir relatos para confirmar o alcance e a recepção do sinal.
O receio da Inspecção dos Serviços de comunicação, polícias do Hertz português, que andavam à “coca” era um facto incontornável e por isso era preciso ter cuidado. Todos os dias era preciso montar e desmontar o vasto equipamento. Para o Mestre não era difícil; o pior de tudo era se o pai Plácido descobrisse as suas actividades clandestinas. Por isso o local de emissão variava consoante o medo e a disponibilidade logística.
O sucesso foi confirmado quando o som de um dos nossos discos foi ouvido lá para a zona da Bela Rosa. Da Loja até à Bela Rosa era obra: era muita distância e isso podia implicar muitos ouvintes, provavelmente mais de cinco. Nesse momento tínhamos concretizado um sonho. O Hotel Califórnia e os álbuns mais recentes dos Génesis eram a nossa Play List mais adoptada, porque a discografia disponível era reduzida e dependente dos recursos de cada um.
Assim, teria nascido a mãe legitima da Rádio Opção, que foi um marco inquestionável na cultura e na intervenção cultural em Alhos Vedros, mais tarde associada à CACAV, que todos reconhecem como uma Associação de prestígio no Concelho da Moita até aos dias de hoje.
(continua)
Luís Mourinha
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